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EMANCIPAÇÃO POLÍTICA DE PAULO AFONSO - Euclides Batista Filho
21/06/2011 14:38

A conjuração pela emancipação de Paulo Afonso começou efetivamente em março de 1952, quando o pernambucano Abel Barbosa e Silva, chefe de escotei-ros, convidou alguns amigos para uma secretíssima reunião. Ao ser convidada, a comerciante Risalva Toledo questionou Abel sobre o motivo do encontro, recebendo a resposta de que somente ficaria sabendo quando comparecesse à reunião marcada para a residência do comerciante Luiz Inocêncio de Lima, às dez horas daquela noite. A assembléia histórica aconteceu na penumbra silenciosa da cozinha do Sr. Luiz Inocêncio, onde um candeeiro substituía as lâmpadas apagadas. Lá estavam então dona Risalva Toledo, Luiz Inocêncio, Abel Barbosa (conhecido como Chefe Abel), João Vicente Ferreira (conhecido como João Sapateiro), João Francisco da Silva (conhecido como João Marceneiro), Antônio Patrício, Francisco Domingos, Altino Gomes (cunhado de Zé Lima), José Aquilino, José Neto, Antônio Neto e Manoel Neto. O sigilo tinha que ser total. Paulo Afonso pertencia a Glória e sua emancipação política contrariava interesses da pequena cidade que não queria perder os impostos do jovem e rico distrito. Como a independência contrariava também interesses da Chesf, nossos heróis corriam muitos riscos, inclusive de vida. Conta Dona Risalva: “Chefe Abel por exemplo, foi abordado por um pistoleiro de aluguel quando comprava ingresso na bilheteria do cinema (atual Caixa Econômica). Estava agarrado com a arma do bandido, em luta corporal, quando o adolescente Josias, seu afilhado e irmão de Xerém, estando no salão de sinuca ao lado, correu em seu auxílio com o taco de jogo. Desferindo violentíssimo golpe na cara do facínora fraturou-lhe o nariz, na maior tacada de sua vida. Aquele não seria o único atentado e todo cuidado seria pouco “.
Como líder do grupo, Abel advertia sobre os perigos a que todos estavam sujeitos, ouvindo dos amigos o compromisso de total e irrestrito apôio à nobre causa, acontecesse o que acontecesse. Assim, aos cochichos e na semi-escuridão, nossos conspiradores lançavam a semente da nossa liberdade, trabalhando para que germinasse. Como parte desse trabalho, Dona Risalva contactava secretamente as mulheres da Vila Poty, para que elas conquistassem a adesão dos maridos, fazendo o movimento crescer em número e importância. As reuniões continuavam acontecendo sob o mais absoluto segredo e nos locais mais diversificados, com o número de simpatizantes aumentando a cada dia. Contudo, alguns adeptos sofriam as mais diversas represálias, inclusive perdendo seus empregos na Chesf, como Zezito do Fórum, Gilberto Leal, etc. Porém, nada os fazia recuar.
Em 1º de maio de 1954, dia do trabalhador, Abel Barbosa, então vereador de Glória, em palanque armado na Rua da Frente (atual Posto Oásis) lançou publicamente a campanha pela emancipação política de Paulo Afonso. Diz Dona Risalva: “A luta cresceu, a perseguição também, mas o desejo de ver Paulo Afonso livre nos dava mais garra e disposição. As pressões aumentavam, pois os adversários viam em nós uma grave ameaça aos seus interesses. Quanto mais faziam oposição, mais trabalhávamos com impressionante coragem”.
Em abril de 1955, início de legislatura, o vereador Abel apresentou na Câmara de Glória a proposta de desmembramento de Paulo Afonso. Como naquela casa a matéria era apoiada apenas por Abel e pelo vereador Moisés Pereira, o obstáculo era intransponível. Como a luta prosseguia, no segundo semestre de 1956 o vereador Abel conseguiu o valiosíssimo apôio do vereador Manoel Moura, líder do prefeito de Glória, que por sua vez convenceu outros vereadores, sendo o projeto de emancipação aprovado em 10/10/1956. Narra Antônio Galdino: “No plenário da câmara municipal de Glória, debates, apartes e questões de ordem. Na ordem do dia projeto-de-lei do vereador Abel Barbosa, propondo a separação política de Paulo Afonso. Várias vezes, no calor das discussões, madrugada adentro, parava-se tudo para socorrer o vereador Moisés Pereira que, muito doente, fez questão de estar presente na discussão da importante matéria. No final do debate o seu voto foi decisivo, completando o número necessário para que Paulo Afonso tivesse vida própria. A centenária Glória perdia seu mais importante distrito”. O vereador Moisés Pereira faleceria poucos dias depois. O projeto foi encaminhado à Assembléia Legislativa em Salvador, onde foi apoiado pelos deputados Otávio Drumond e Clemens Sampaio. Enfim, depois de cumpridas todas as formalidades legais, o governador Antônio Balbino de Carvalho Filho sancionou a Lei nº 1.120 em 28/07/1958, que tornou Paulo Afonso independente.
A notícia da emancipação estourou como uma bomba de indescritível alegria. Em palanque armando no mesmo local do lançamento oficial em 1954, aguardava-se o Chefe Abel que vinha de Salvador. Enorme caravana dirigiu-se ao povoado Riacho para receber o libertador de Paulo Afonso, que, sobre um jipe aberto, entrou na CIDADE ovacionado e acenando com o Diário Oficial. Ao subir no palanque que o aguardava, com a voz embargada por fortíssima emoção, apenas conseguiu dizer: “Pauloafonsinos, eis o meu e o vosso sonho de liberdade realizado”. Inflamados oradores fizeram apaixonados discursos, dentre os quais, José Rudival de Menezes e José Freire (do abrigo).
Muito emocionada, como se um filme estivesse passando em sua memória, Dona Risalva Toledo, heroína da nossa liberdade, afirma hoje: “Somente Deus pode avaliar o tamanho da alegria que sentimos todos, especialmente eu. Palavras não expressam... “.